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quarta-feira, 22 de junho de 2022

O PODER DA ESPERANÇA

 


 

É inegável que os heróis viralizaram em nosso cotidiano. São filmes, séries, aumento substancial do espaço no setor de HQs e animes das livrarias, além de incontáveis canais vivendo disso no YouTube. Mas o que estaria causando esse aumento tão grande de consumo? Por que os heróis são tão necessários hoje?

Nós sempre encontramos inspiração nas lendas e contos antigos. Aliás, ainda fazemos isso, apesar da nova roupagem que damos aos mitos. Apolo, agora, encontra a força do sol através do “S” no peito de Superman. Hades, deus do submundo, incorpora uma capa e máscara de morcego tornando-se o cavaleiro das trevas e criando ordem na escuridão. Diana de Themyscira, a Mulher Maravilha, resgata os ideais de Atena e ganha o mundo com sua espada e escudo. O antigo Capitão Marvel (agora SHAZAM) traz o poder de Zeus em suas mãos. E o rápido e ágil mensageiro do Olimpo Hermes, encontra sua versão moderna nas pernas do velocista Flash. E tudo isso só dentro do universo DC.

Toda vez que o mundo real sofre um golpe de desesperança, um herói é invocado para inspirar e encorajar as pessoas a continuarem seguindo em frente. Após a depressão de 29 as pessoas viram o símbolo da superação em um super homem que dava grandes saltos, levantava carros e, mais tarde subiu aos céus com seu uniforme azul e capa vermelha.  Já no começo da década de 80, o tráfico de drogas e cartéis tomaram conta das grandes metrópoles americanas. Em 89, Batman de Tim Burton lota as salas de cinema. Na tela, um homem angustiado pelo assassinato dos pais lança luz na escuridão e afugenta criminosos em becos esfumaçados. Em 91 começa a Guerra do Golfo que dá a Osama Bin Laden a polarização que precisava para formar um exército de terroristas. Em 98, a Al-Qaeda explode as embaixadas americanas no Quênia e Tanzânia. Mais tarde, ataca um navio da marinha americana com explosivos C4. Em 2001, explode as torres gêmeas do Word Trade Center. Em 2002 é lançado Homem Aranha, contando a história de um homem munido de poderes bélicos e que não hesita em explodir pessoas inocentes para atender seus ideais distorcidos e busca pelo poder. O filme leva 1,3 milhões de pessoas às salas de cinema no primeiro final de semana. Pelo menos na ficção, todos nós pudemos ver nosso herói impedir que o mal recaísse sobre a cidade de Nova York, sob a luz do tema encorajador de Danny Elfman (o mesmo criador do tema de Batman de 89). Já em 2005 um filme polêmico mostra que o vilão que puxa o gatilho não é necessariamente quem fabrica a arma. O Senhor das Armas, com Nicolas Cage, acende o debate sobre quem é quem no mundo dos heróis e vilões. Empresários americanos são apontados como os grandes fabricantes de armas do mundo, vendendo toda espécie de poder de fogo para os conflitos do exterior. Em 2008 o cinema conta a história de um excêntrico e milionário fabricante de armas, que acaba sendo alvejado por um de seus próprios mísseis. Machucado e exilado em uma caverna, ele percebe que o mal que causamos ao outro, cedo ou tarde retornará a nós. Tony Stark renasce como Homem de Ferro e abre uma nova era na indústria do entretenimento. A Marvel toma conta do mercado nos anos seguintes até o momento derradeiro mostrado em Vingadores Guerra Infinita (2018) e Ultimato (2019). O filme mostra que a união de todos os povos pode realmente sobrepujar o mal e reacender a chama da esperança. O olhar desesperado de Thanos (vindo de Thanatos – personificação da morte) ao ver o prenúncio de sua derrota naqueles que ele julgava fracos e desprezíveis, nos dá a sensação de que poderíamos realizar qualquer feito, se deixássemos nossas diferenças de lado e déssemos as mãos. 

Se é a desesperança que invoca o herói e se o consumo de heróis aumentou tanto, então esse é o termômetro de que estamos mergulhados na desesperança como nunca estivemos. Pensando dessa forma, a verdadeira pergunta seria: por que a desesperança cresceu tanto entre nós? Por que antes ela parecia vir em ondas espaçadas, enquanto que, agora, parece ter se tornado uma nuvem escura e permanente sobre nossas cabeças? Nós vimos em Vingadores (2012) que Stark (Homem de Ferro), Rogers (Capitão América), Banner (Hulk) e Thor anularam completamente seus potenciais ao entrarem em uma disputa de egos. Bem, talvez estejamos fazendo isso na vida real. Nós criamos uma revolução na comunicação nas ultimas duas décadas e nos conectamos com o mundo inteiro. Poderíamos criar o paraíso com isso, mas decidimos viver no inferno, nos comparando uns com os outros até mergulharmos em uma sensação fortíssima de insignificância e irrelevância. Criamos um mercado inflacionário de egos. Hoje, é mais importante parecer feliz do que ser feliz. É mais relevante bater uma foto em pose de meditação do que meditar. Não hesitamos em gastar nosso tempo e energia parecendo relevantes ao invés de construir algo que faça sentido para nós. Criamos uma corrida que vai do nada a lugar nenhum. O resultado dessa loucura é que estamos sempre tomados por uma sensação de desvantagem. Nos sentimos apenas mais um grãozinho de areia em uma praia infinita. Achamos que milhares de pessoas são melhores do que nós, mais bem sucedidas, mais aptas, mais preparadas, mais experientes, mais bonitas, mais felizes e mais gratas pela vida. Não conseguimos mais encontrar nosso lugar ao sol ou até mesmo o motivo de estarmos aqui. As novas gerações são as que mais sentem esse fardo. Se sentem derrotadas antes mesmo do jogo começar. A cobrança vinda da comparação e da ansiedade, inabilidade, desinformação e agressividade dos familiares apenas pioram ainda mais a situação. Se refugiam na alienação e buscam desesperadamente nos heróis alguma mensagem que possa vir como um lapso de esperança no meio do caos absoluto.

Nossas mãos deveriam acolher mais. Nossos dedos deveriam apontar menos. Temos gerações inteiras entrando em depressão enquanto a velha ignorância brada para todos os lados que a desesperança é frescura, falta do que fazer, falta de Deus no coração, de lote pra carpir ou de pia pra lavar. A ausência de empatia e a desinformação são vilanias que ainda reinam em muitas famílias. Drenam a pouca energia que ainda resta naqueles que nem tiveram a chance de começar suas vidas. Meninos e meninas com potencial ceifados, antes mesmo de desabrocharem, e que poderiam ser os verdadeiros heróis desse mundo, criando e trazendo soluções há muito esperadas por todos nós. Quando nós aprendermos a cultivar o potencial, criatividade e curiosidade de cada criança ao invés de podá-los, viveremos em uma nova era onde os super-heróis não serão mais necessários. E aí, talvez, consigamos, todos juntos, enfim... ser felizes para sempre!